segunda-feira, 23 de agosto de 2010

Terrorismo desafia políticas de imigração do Canadá

Há cerca de duas semanas, o navio MV Sun Sea singrou as águas territoriais canadenses. A embarcação, de bandeira Tailandesa, navegara desde o Sri Lanka e trazia uma "carga" de 492 refugiados políticos. Na sexta-feira 13 de agosto, os refugiados foram escoltados para a costa. O MV Sun Sea ancorou na base naval de Esquimalt, próximo de Vancouver, em British Columbia - B.C.. Em Esquimalt deu-se o desembarque e o início do processo de triagem dos refugiados, que cruzaram o Índico e o Pacífico, para recomeçar a vida na América, como tantos outros de nossos antepassados de outros tempos. E o Canadá mergulhava no debate sobre suas políticas de imigração e de asilo a refugiados políticos, submerso em controvérsias modernas.

Em outubro do ano passado, outro navio com 76 "refugiados" do Sri Lanka havia adentrado as águas de B.C., tal como o MV Sun Sea. Desembarcados, os imigrantes vieram para a comunidade Tâmil de Toronto. Mais tarde, os "refugiados" foram identificados como Tigres Tâmeis, grupo político com práticas terroristas banido do Canadá. Daí a perturbação que este novo navio trouxe à opinião pública, e a resultante polarização das discussões políticas canadenses. A intensidade dos debates aumentaria com os novos fatos apurados após o desembarque dos "recém-refugiados" de 13 de agosto.

Duas semanas após a ancoragem do MV Sun Sea, houve subsídios para confirmar a suspeita de tráfico humano: a viagem transoceânica teria custado entre 30 e 50 mil dólares por cabeça. Os que não puderam pagar adiantado, obrigaram-se a pagar suas dívidas em território canadense. Como? Não se sabe. Só se pode imaginar. A suspeita de dezenas, até uma centena ou duas centenas, de militantes do grupo extremista Tigres Tâmeis entre os "refugiados", fora corroborada por familiares de outros passageiros residentes no Canadá.

Os Tigres Tâmeis são representativos de uma minoria étnica do Sri Lanka e se utilizam de atos de terror na sua luta política. Eles possuem pequena base política em Toronto, mas a comunidade de imigrantes do Sri Lanka é importante e sofre de extorsão e ameaças dos militantes Tigres Tâmeis. As autoridades canadenses lutam para desmantelar e acabar com as atividades dos Tigres Tâmeis no Canadá. Deste modo, um reforço de supostos até 200 ativistas não é nada bem vindo.

A questão é pano de fundo para um debate mais sério e profundo: o Canadá deve ou não alterar suas Leis de abrigo aos refugiados políticos e perseguidos e ameaçados de morte em outros países? Há como separar o joio do trigo, sem alterar as Leis Humanitárias que os canadenses acreditam e veneram? Como o Canadá pode acolher perseguidos políticos e defender-se do abuso de traficantes de almas? E ainda pior: como o Canadá deve se proteger de minorias políticas, praticantes de atos terroristas, que se utilizam das Leis de Asilo do Canadá para arquitetarem, em solo canadense, seus ataques com mulheres-bomba - caso dos Tigres Tâmeis?

Sob a ótica das Leis de Imigração do Canadá, o desafio político não é menor. Se o MV Sun Sea trazia 2 ou 202 Tigres Tâmeis, trazia também de outro lado 490 ou 290 imigrantes "refugiados políticos" vindos do Sri Lanka. Se estes imigrantes eram ou não eram "refugiados políticos" há que se apurar. Caso não sejam "refugiados", são fura-filas do processo de imigração, do qual 250 mil pessoas são habilitadas anualmente pelo Canadá para imigrar para o país.

Assim, para além do tenebroso tráfico humano e do terrorismo execrável, há um terceiro elemento que se sobrepõe a tudo isto: o desrespeito absoluto, para não afirmar a quase desmoralização, dos ritos de imigração a que milhares de pessoas mundo afora se submetem para conseguir o visto de Residência Permanente no Canadá. A mensagem para os demais candidatos a imigrantes é clara: ao invés de esperar o processo de imigração, siga a antiga Lei de Gérson brasileira. Pegue um barquinho, reme para o Canadá e grite: "refugiado político - asilado"! Pronto, você passou na frente da fila de 2 a 3 anos de espera, e com garantia de aprovação, mesmo que não se enquadre em critério algum prescrito pelo Canadá.

A chegada do MV Sun Sea abriu intensos e flamejantes debates. A mídia - TVs, jornais e mídia eletrônica, e a opinião pública em geral, se defrontaram com temas graves e de segurança nacional: a necessidade intransponível de importação de gente pelo Canadá vs. os riscos advindos da política humanitária constitucional e das falhas nas políticas e leis de imigração do país. Como diria Nelson Rodrigues, o debate não passou do óbvio ululante. Os políticos e a intelligentsia canadenses preferiram ater-se ao curtíssimo prazo: como evitar futuras frotas de navios de traficantes de almas acostarem em nossas praias, com ou sem terroristas e/ou novos fura-filas?

A temperatura elevada fez o caldo ferver e entornar da panela de discussões plausíveis e racionais. Ideias "iluminadas" não faltaram: interceptação de navios em águas internacionais, para forçá-los a mudar de rumo (como? não ficou bem explicado) - o que seria equivalente a um ato de guerra ao país da bandeira do navio. Ou ainda: devolução dos refugiados para o alto-mar, mesmo que isto significasse matar a todos de fome e de sede, pois os passageiros chegam depauperados, depois de um a dois meses de viagem transoceânica.

No campo mais racional, mas ainda em fogo alto, o Ministro Canadense da Segurança Pública Vic Towes lembrou que a Austrália devolveu o MV Sun Sea, pois as leis australianas assim o permitiam. Towes bradou por alterações nos processos de triagem de imigrantes, que tardavam até oito anos para defenestrar os penetras, quando então já era tarde demais. Culpada: a Suprema Corte do Canadá, que havia tornado Lei, um procedimento longo e tortuoso, que de fato faz impossível expelir de pronto qualquer "asilado". E para tanto basta que o cidadão grite "refugiado!" nos mares, ares ou terras canadenses - já entrou no Canadá e c´est fini!

Os mais contidos, mas não menos míopes, propuseram a criação de uma ou mais Ellis Island do Canadá, nos moldes da que ostenta a Estátua da Liberdade em Nova Iorque. Estes locais de triagem manteriam os "fura-filas" e/ou "refugiados" em "quarentena", sem tempo pré-determinado para liberação, podendo ser de no mínimo dois anos até à extradição eventual. Eu as batizo de "guantânamos canadenses". Haveria assim uma maneira efetiva de impor controle aos potenciais terroristas e traficantes de almas, de um lado; e a criação de um desincentivo para os "fura-filas", que ficariam "quarentenados" por dois, três, cinco ou dez anos até.

O tema é complexo e controverso. E assim sendo, requer reflexão e debate. Requer a discussão entre ideias contrárias e a acomodação de múltiplas visões da realidade difusa. Não há soluções mágicas, nem fórmulas prontas. O Canadá, país humanitário e progressista, está colocado contra a parede por forças destrutivas, advindas da tal globalização, um fato. O Canadá é vítima de suas próprias virtudes superiores.

E todos nós somos vítimas dos processos históricos e socioeconômicos do capitalismo vencedor do fim da história do século XX. O Século XXI começou tristemente. Vemos brilhar os fantasmas das Torres Gêmeas quando olhamos o skyline de Nova Iorque. Os fantasmas nos lembram que o ano Um ou o Primeiro Ano deste Terceiro Milênio foi sísmico e cataclísmico. Os terríveis acontecimentos de 11/09/2001 foram uma metáfora e o prenúncio dos desafios humanos no século XXI e das gerações a nos seguirem.

Nestes momentos de profunda escuridão, advindos de mudanças que não compreendemos por completo, devemos fechar os olhos calmamente, para enxergarmos com clareza o caminho de volta para a luz, ao abri-los ainda no escuro. Ver no escuro requer que nos acostumemos com a falta de luz, para não nos iludirmos com nossas próprias sombras. Os refletores imensos, repentinamente acesos por forças maniqueístas, a iluminar soluções fáceis e simplórias, simplificadoras de realidades complexas, estão a serviço de minorias raivosas, partidárias e intere$$eiras.

A lucidez durante a escuridão é não ter razão. Tudo menos ter razão, como ensinou um de nossos poetas maiores, Fernando Pessoa. Vamos sentir os problemas complexos e os desafios controversos, para encontrar o humano em nós, na busca da solução dos problemas humanos.

O Canadá civilizado e multicultural, com suas Leis Humanitárias e de Imigração aos demais povos do mundo, merece mais do que histeria e medos de fim de mundo. O Canadá não possui Barack Obama, mas Stephen Harper e seu Gabinete Conservador não é W. Bush e seus Falcões da Guerra do Iraque.


God Save The Queen! Salve o Canadá civilizado, humanitário e democrático.

Fonte

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