Quase todos os dias, durante uma recente permanência em Jerusalém, passava diante da barraca que os pais do sargento Gilad Shalit, o militar israelense que foi capturado em 2006 pelo Hamas, montaram em frente à residência do primeiro-ministro de Israel. Sua vigília foi longa.
Entristecidos, porém sempre dignos, e na maior parte do tempo sem saber se seu filho estava vivo ou morto, os Shalit literalmente não deram trégua à consciência de Binyamin Netanyahu e do país.
Minha cabeça me dizia que, ao atender à exigência do Hamas de libertar mil prisioneiros em troca de Shalit, Israel encorajaria mais sequestros e libertaria terroristas que quase certamente matariam mais israelenses. Mas o meu coração me dizia que esses pais desolados mereciam todo o apoio do mundo. No fim, meu coração venceu e fui até a barraca, assinei a petição e deixei um donativo.
Estava convencido de que fizera uma coisa errada.
Na semana passada, Israel concordou trocar Shalit por 1.027 prisioneiros palestinos. O sargento chegou a Israel e os primeiros 477 presos foram soltos. Não culpo Netanyahu, seu gabinete ou seus serviços de segurança por cederem ao seu coração.
Não deve ter sido fácil. Entre os prisioneiros que foram soltos estão pessoas que tramaram os ataques suicidas numa pizzaria de Jerusalém (15 mortos), um hotel na Páscoa em Netanya (30 mortos), um ônibus em Jerusalém (11 mortos) e um ônibus em Haifa (17 mortos).
Evidentemente, as autoridades israelenses que aprovaram a troca estavam dispostas a pagar um preço alto para manter o sentimento de solidariedade em Israel. Eles querem que os pais israelenses tenham a certeza de que o governo fará tudo o que estiver ao seu alcance para salvar seus filhos eventualmente capturados. Cientes disso, os soldados israelenses presumidamente se sentirão mais dispostos a ir para a batalha.
Entretanto, os líderes israelenses deveriam ter se deixado guiar por sua cabeça, ainda que a decisão fosse mais dolorosa. As consequências da libertação de prisioneiros em outras épocas deveria tê-los convencido de que, a longo prazo, a troca quase certamente se revelaria a opção mais cara. Segundo uma estimativa, nos últimos trinta anos Israel soltou cerca de 7 mil prisioneiros árabes em troca de cerca de 16 israelenses e dos corpos de mais dez.
Cerca de 10 mil prisioneiros árabes foram soltos desde 1985. Um relatório de 2007 elaborado por um grupo de vítimas do terrorismo, afirma que, nos cinco anos antes do estudo, 177 israelenses foram assassinados por terroristas reincidentes que haviam sido libertados.
Abbas ibn Muhammad Alsayd, solto em 1996, envolveu-se posteriormente em três ataques. Em 1998, Iyad Sawalha foi solto num gesto de "boa vontade"; em 2002, detonou uma bomba que matou 17 pessoas. Ramez Sali Abu Salmin, solto em 2003, mais tarde se explodiu em um café de Jerusalém, matando 7.
Os líderes israelenses deveriam saber que libertar 1.027 prisioneiros em troca de um soldado terá como resultado novos sequestros, e que essas chantagens e libertações em massa, aliás desproporcionais, terão de acabar.
O porta-voz da ala militar do Hamas declarou que o sargento Shalit "não será o último soldado a ser capturado pelo Hamas enquanto Israel mantiver em seu poder prisioneiros palestinos". Outro grupo, Comitês de Resistência Popular de Gaza, que participou do sequestro do sargento Shalit, anunciou: "O sequestro é a nossa estratégia".
Ontem, Wafa al-Bass, presa em 2005 quando contrabandeava uma bomba para ser utilizada em um atentado suicida no posto de controle de Gaza, afirmando que ia procurar tratamento médico, disse, após ser solta, que os palestinos deveriam "tomar um Shalit" a cada ano, enquanto outros presos palestinos não fossem libertados.
Não é preciso ler a obra do psicólogo B.F. Skinner para compreender o perigo do reforço positivo representado pela troca de prisioneiros por israelenses sequestrados. Basta ler o próprio Netanyahu, que em seu livro de 1995, Fighting Terrorism, escreveu: "A libertação de prisioneiros só encoraja os terroristas dando-lhes a sensação de que, mesmo que sejam apanhados, sua punição será de curta duração. Pior ainda, levando os terroristas a pensar que suas exigências serão provavelmente atendidas, ela encoraja exatamente a chantagem terrorista que pretende combater".
A volta aos ataques terroristas contra os israelenses não é a única consequência. O caso de Shamir Kuntar, que foi libertado em 2008 em troca dos restos mortais de dois soldados israelenses, deveria servir de lição. Kuntar havia assassinado um israelense na frente de sua filha de 4 anos e depois matou a menina esmagando sua cabeça com o fuzil - enquanto a esposa do homem, escondida nas proximidades, acidentalmente sufocava sua filhinha de dois anos ao tentar fazer com que ficasse em silêncio.
Kuntar agora é um herói. Ele e outros prisioneiros soltos foram homenageados pelo presidente do Irã, Mahmoud Ahmadinejad. Ele deu a Kuntar uma medalha por "apoiar a resistência palestina e libanesa".
Dito isso, é absurdo ver Israel trocando um soldado, ou mesmo restos mortais, por centenas de prisioneiros como uma estratégia destinada a fortalecer o sentimento de solidariedade ou o moral do país.
O que dirão os líderes israelenses aos parentes dos civis que quase seguramente serão mortos pelos prisioneiros soltos no acordo - e aos pais dos soldados que serão sequestrados pelo Hamas para provocar novas trocas de prisioneiros? Continuar assumindo riscos com a vida das pessoas pela paz talvez seja necessário para a liderança israelense. Entretanto, não é necessário assumir riscos suicidas que salvarão um soldado, mas garantirão o sequestro de outros e o assassinato de muitos outros israelenses.
Nosso coração pode comemorar com a família Shalit. Mas nossa cabeça não pode deixar de se preocupar ao contemplar os muitos sequestros e mortes que sua libertação produzirá.
Fonte: O Estado de São Paulo
Fonte: O Estado de São Paulo
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