| 17 Março 2011
Mil anos depois das Cruzadas e as forças se invertem em função do fanatismo materialista e ateísta que domina o Ocidente depois do Iluminismo.
Parte II - Democracia e Islam: coexistência possível?
Para nós, ocidentais, a palavra democracia imediatamente evoca outra: liberdade. Mas, como argumenta Raymond Ibrahim (Is an Egyptian "Democracy" a Good Thing?) no Middle East Forum, não há nada inerentemente liberal, humanitário ou secular no conceito de democracia. Considerando Atenas, a primeira democracia da história, aceitava o princípio da escravatura e o status das mulheres daria orgulho aos Talibans, enquanto na 'autoritária' Esparta elas tinham um grau muito maior de igualitarismo. Platão evitava a democracia, preferindo os 'reis filósofos' para o 'bem do povo'. A democracia americana também, durante uns 60 anos admitiu a escravidão e alguns dos Founding Fathers tinham escravos, como Washington. Os exemplos do Ocidente não são nada animadores. Nas democracias ocidentais o povo pode votar baseado em suas necessidades imediatas, emoções, desinformação ou por pura propaganda enganosa - nós, brasileiros sabemos muito bem disto, principalmente quando o voto em qualquer candidato mesmo de 'oposição' pode ser baseado nesta propaganda, como nas últimas eleições. Mas as democracias ocidentais incluem salvaguardas como os cheks and balances, e se for baseada no Corão, como no Irã cuja Constituição é baseada na Sharí'a?
Muitos scholars muçulmanos argumentam que o conceito de democracia é puramente ocidental e que estes tentam impô-la ao Islam. Outros acham que o Islam precisa de um sistema democrático e que este conceito tem uma base sólida no Corão, desde que a Sura 42:38 recomenda a 'consulta mútua' entre o povo. Vejamos o que diz esta Sura [[i]]: (São aqueles) que atendem ao seu Senhor, observam a oração, resolvem os seus assuntos em consulta e fazem caridade daquilo com que os agraciamos.
Comenta o Tradudor: Consulta, esta é a palavra chave da Sura e sugere o ideal de como um homem de bem deve conduzir seus assuntos. Este princípio era aplicado em todos os sentidos pelo Profeta, em sua vida particular e pública.
Algum leitor consegue ver nisto um traço sequer de base para um regime democrático? Vislumbra-se o germe do processo democrático? Ou, pelo contrário, impõe uma total falta de liberdade em decidir a própria vida sem consultar os demais membros da comunidade? A meu ver, é o ideal do coletivismo e foi muito bem expressado jocosamente por Olavo de Carvalho alhures ao definir o intelectual coletivo: se o sujeito é mordido por um cachorro ele precisa imediatamente ligar para seus pares e perguntar se ele está certo ou está sofrendo uma alucinação!
Numa discussão bem fundamentada, Islam and Democracy (Humanities, November/December 2001, Volume 22/Number 6), John L. Esposito e John O. Voll argumentam que a relação é muito complexa, existindo vários grupos islâmicos que convivem democraticamente em países nos quais estão em minoria, mas quando atingem a maioria rejeitam a separação entre religião e política, o tradicional approach secular. Alguns defendem, portanto, que grupos islâmicos só advogam a democracia como uma tática para ganhar poder político. Da mesma maneira que os comunistas são os maiores defensores da democracia, até chegarem ao poder!
Relativamente à Sura acima os autores afirmam que muito pensadores islâmicos enfatizam a importância da consulta mútua ou shura. Na visão do Ayatollah Baqir al-Sadr, líder shi'ita executado por Saddam Hussein, o povo tem o direito geral de dispor de seus assuntos na base do princípio da consulta. O ex-presidente do Irã, Mohammad Khatami referiu que o povo tem um papel fundamental em eleger o governo, supervisionar e possivelmente substituí-lo sem nenhuma tensão ou problema.
Creio que isto não passa de demagogia, pois no seu país quem decide quem governa é o Supremo Conselho da Revolução e não o povo. O eleitorado só pode votar nos candidatos previamente aprovados pelo Conselho e este terá a palavra final sobre a eleição. Khatami, no entanto, entende muito bem o conceito ocidental de democracia e seus riscos: as democracias existentes não seguem necessariamente a mesma fórmula. É possível que a democracia leve a um sistema liberal. É possível que leve a um sistema socialista. Ou à inclusão de normas religiosas no governo. Nós aceitamos esta terceira opção. Acrescentou, lucidamente, que atualmente as democracias estão sofrendo de um grande vácuo, o vácuo da espiritualidade e que o Islam pode ter a estrutura para combinar democracia com espiritualidade e um governo religioso.
Os Founding Fathers não discordariam, pois basearam o regime republicano no fundamento religioso que hoje tende a desaparecer por força do processo democrático que tanto temiam. A solução que encontraram, no entanto, foi proibir o Congresso de fazer leis concernentes à religião para impedir que o governo se intrometesse nos assuntos religiosos, protegendo as religiões. Mas ela está presente em quase todos os atos governamentais: os juramentos, em qualquer nível, são feitos sobre a Bíblia, o fundamento das leis são as Leis Mosaicas, etc. Esta separação entre religião e política é característica da tradição judaico-cristã e jamais poderá ser aceita pelo Islã, pois a síntese de espiritualidade e governo é o próprio coração do Islam. A proclamação 'não há outro Deus senão Allah', a unicidade de Deus, é aceita por todos os monoteístas, mas no Islam este conceito, tawhid, é uma visão de mundo (Weltanshauung) que significa conceber todo o universo como uma unidade, ao invés de dividi-lo entre este mundo e o próximo, entre espírito e corpo. Nesta visão de mundo a separação entre religião e política cria um vácuo espiritual nos negócios públicos e abre caminho para sistemas políticos em que os valores morais estão ausentes. Neste sentido, um estado secular abre o caminho para o abuso do poder [[ii]]. Veja-se o estado islâmico secular do Partido Baath no Iraque onde houve uma sucessão de ditadores cada vez mais sanguinários.
Olhando para o século passado no Ocidente, pode-se discordar disto? A ascensão de Hitler ao poder foi absolutamente constitucional. Os 'palestinos' votaram em massa numa organização terrorista, o Hamas, o regime 'autoritário' do Xá era cultural e socialmente liberal e foi derrubado pelo povo fanatizado, dando lugar à tirania dos Ayatollahs. E não se acredite que a oposição a Ahmadinedjad tenha algo a ver com democracia e muito menos liberdade. É briga de cachorro grande em que o povo entra como bucha de canhão.
Hoje em dia assistimos a uma perda generalizada e completa dos valores morais. A separação entre religião e política foi invertida, defendendo-se não mais um estado laico, mas um estado ateu e materialista no qual as religiões não podem se intrometer, numa mistura confusa com um multiculturalismo e um sincretismo ridículos. As 'transgressões' são aplaudidas, valores tradicionais são ridicularizados - não só os religiosos, também os morais - em nome da modernidade ou pós-modernidade. O cristianismo retrai-se envergonhado de si mesmo, o judaísmo pior ainda: criou-se um monstrengo chamado 'judeus laicos' que mal sabem o que diz a Torah! Os 'liberais', judeus ou cristãos, trocaram o Deus da Bíblia pelo deus cifrão: tudo pela livre iniciativa e pelo liberalismo econômico independentemente de quaisquer sentimentos morais. Os socialistas pelo homem: o Conducător [[iii]], o Führer, o Duce, o Pai dos Povos, o Grande Timoneiro, o Caudillo por La Gracia de Diós. A este é concedida plena indulgência prévia por seus atos, pois sempre agem 'por amor ao povo que os adora'.
É neste vácuo de espiritualidade que o Islam pode penetrar entre os ocidentais, como alerta há mais de dez anos Olavo de Carvalho. Mil anos depois das Cruzadas e as forças se invertem em função do fanatismo materialista e ateísta que domina o Ocidente depois do Iluminismo. Os Cruzados estavam certos de agirem para defender o Santo Sepulcro e os Lugares Sagrados do cristianismo. Hoje nada disto subsiste, nem como fé, nem mesmo como símbolo que seja! A fé fanática de hoje é na Sagração da Ciência e da onipotência do conhecimento humano. Nada transcende o homem auto-sacramentado e seus Condutores Iluminados.
A penetração do Islam está sendo uma verdadeira Cruzada, sem cruz, pois esta os ofende e amedronta - amedronta por enquanto, pois os que deveriam carregá-la com fé e orgulho, sentem vergonha dela! E se o Islam perder o medo e ganhar a guerra? Viveremos submetidos à sharí'a?
Notas:
[i] O Significado dos Versículos do Alcorão Sagrado, Com Comentários, Trad. Prof. Samir El Hayek, com a chancela do Sheik Ahmad Saleh Mahairi, Mestre em Exegese pela Universidade de Riadh, Arábia Saudita
[ii] Ali Shariati, On the Sociology of Islam, citado por Sposito & Vol [iii] Título oficial de Nicolae Ceauşescu na Romênia
Parte III - O conflito oculto
As forças históricas que hoje disputam o poder no mundo articulam-se em três projetos de dominação global: o "russo-chinês" (ou "eurasiano"), o "ocidental" (às vezes chamado erroneamente "anglo-americano") e o "islâmico". (...) No terceiro, eventuais conflitos de interesses entre os governos nacionais e o objetivo maior do Califado Universal acabam sempre resolvidos em favor deste último, que hoje é o grande fator de unificação ideológica do mundo islâmico. (...) Embora em princípio as relações entre eles sejam de competição e disputa, às vezes até militar, existem imensas zonas de fusão e colaboração, ainda que móveis e cambiantes.
Olavo de Carvalho, no artigo 'Os donos do mundo'. A análise política dos fatos no Oriente Médio (OM), como já afirmei no início deste artigo (parte I), continua sendo feita numa base que eu chamo de flat mind, que pode ser traduzido por 'mente achatada', ou bi-dimensional: tudo se resume a uma oposição entre ditadura e democracia e ponto final! Deve ser a influência da destruição neuronal causada por anos de adestramento canino em marxismo. Não há nuances, não existem outros fatores, nada, nem se leva em consideração possíveis conseqüências do desenrolar do movimento. Ouvi na CBN de uma das mais conceituadas analistas políticas das organizações Globo esta pérola:
"quando a gente sente este frêmito de liberdade, esta luta pela liberdade, nada mais interessa! É preciso apoiar esta juventude revoltada que só se interessa por ser livre! O que virá depois? Não sei, nem interessa, a liberdade é fundamental, depois eles resolvem."
Assim é a maioria, senão a totalidade, dos comentários baseados num feeling, numa 'sensação de uma corrente de liberdade': alguns comentam que "quando vejo aquela juventude lutando, derrubando ditadores, sinto uma corrente de liberdade me perpassar!" Como a única corrente que eu consigo sentir é a elétrica, se tocar em fios desencapados, prefiro usar meus conhecimentos e os de minhas fontes para basear minhas análises. É de uma destas, Olavo de Carvalho, que vem a explicação para este comportamento da mídia. No mesmo artigo que coloquei em epígrafe, acrescenta:
Praticamente todas as análises de política internacional hoje disponíveis na mídia do Brasil ou de qualquer outro país refletem a subserviência dos "formadores de opinião" a uma das três correntes em disputa, e, portanto o desconhecimento sistemático de suas áreas de cumplicidade e ajuda mútua. Esses indivíduos julgam fatos e "tomam posições" com base nos valores abstratos que lhes são caros, sem nem mesmo perguntar se suas palavras, na somatória geral dos fatores em jogo no mundo, não acabarão concorrendo para a glória de tudo quanto odeiam. Os estrategistas dos três grandes projetos mundiais estão bem alertados disso, e incluem os comentaristas políticos - jornalísticos ou acadêmicos - entre os mais preciosos idiotas úteis a seu serviço.
Praticamente todas as análises de política internacional hoje disponíveis na mídia do Brasil ou de qualquer outro país refletem a subserviência dos "formadores de opinião" a uma das três correntes em disputa, e, portanto o desconhecimento sistemático de suas áreas de cumplicidade e ajuda mútua. Esses indivíduos julgam fatos e "tomam posições" com base nos valores abstratos que lhes são caros, sem nem mesmo perguntar se suas palavras, na somatória geral dos fatores em jogo no mundo, não acabarão concorrendo para a glória de tudo quanto odeiam. Os estrategistas dos três grandes projetos mundiais estão bem alertados disso, e incluem os comentaristas políticos - jornalísticos ou acadêmicos - entre os mais preciosos idiotas úteis a seu serviço.
Esta é a razão pela qual os verdadeiros conflitos que subjazem a esta visão bi-dimensional tacanha - e inexistente - permanecem ocultos do grande público. E inúmeras perguntas ficam no ar:
- por que o ocidente 'descobriu' subitamente que os Presidentes e Primeiros Mandatários, antes respeitáveis, são ditadores que devem ser derrubados [[i]]?
- por que a Arábia Saudita ofereceu ajuda a Mubarak, antes da queda e proibiu a Fraternidade Muçulmana em seu território?
- por que os sauditas rapidamente aumentaram a produção de petróleo para compensar as perdas com o óleo líbio?
- por que a Turquia apóia incondicionalmente Khadafi?
- por que Khadafi acusa a revolta de uma manobra simultânea de Estados Unidos e a rede terrorista Al Qaeda?
- por que belonaves iranianas armadas com mísseis atravessaram o Canal de Suez, rumo à Síria?
- por que o Iraque e a Síria sumiram do mapa e o Iêmen e o Bahrein assumiram importância fundamental?
- por que o Bahrein pediu a intervenção dos sauditas?
- por que as organizações globalistas, como a AVAAZ, uma das organizações globalistas ligada a Soros, espalham abaixo-assinados 'contra a repressão'?
- finalmente, por que Obama deu todo apoio aos revoltosos?
Há alguma resposta que satisfaça a todas as perguntas acima? Há sim e vem a seguir. Mas antes, um pouco de história.
A primeira expansão do Islam
O Alcorão foi revelado a Mohammad numa época em que o mundo vivia em sobressalto, enfrentando problemas religiosos, sociais e econômicos. Havia dois Impérios: o Persa e o Bizantino, que dividiam o poder entre si e apesar de suas sólidas forças militares, suas lutas políticas internas tiveram um papel preponderante no enfraquecimento de ambos. (...) Os Árabes viviam divididos em tribos que combatiam entre si e disputavam seitas religiosas. (...) O Islam e o Alcorão reuniram os Árabes que constituíram uma nação, que se expandiu pela terra para que nela, posteriormente, surgissem milhões de pessoas que abraçariam o Islam e seguiriam seu Livro.
Samir El Hayek, 'O Alcorão Sagrado', apresentação [[ii]]
Ocupados em seus conflitos seculares, nem o Império Romano nem o Persa parecem ter suspeitado da propaganda pela qual Maomé, em meio a uma luta confusa de tribos, daria a seu povo uma religião que logo se projetaria sobre o mundo, junto com sua dominação. (...) A conquista árabe, que se desencadeia ao mesmo tempo sobre a Europa e a Ásia, é sem precedentes. Pode-se comparar com a rapidez das conquistas de Átila, Gengis Khan ou Tamerlão. Mas estes últimos foram tão efêmeros quanto a conquista do Islã será duradoura.
Henri Pirenne, 'Maomé e Carlos Magno' [[iii]]
Tanto El Hayek, expoente da cultura islâmica brasileira, como Pirenne (1862-1935), um dos maiores historiadores católicos, professor das Universidades de Ghent e Liège, Bélgica, concordam que a expansão islâmica se deu contra impérios já em fase de decadência. O movimento ocorreu com uma rapidez impressionante. Entre 634 e 641 tomou Damasco e depois toda a Síria, Jerusalém e atravessou o Jordão. Ao leste a Mesopotâmia e a Pérsia. Finalmente cai o Egito e de roldão todas as possessões bizantinas do norte da África, exatamente o Maghreb (palavra árabe que significa literalmente 'lugar do pôr-do-sol: Oeste/Ocidente): Líbia, Tunísia, Argélia, Marrocos e Mauritânia, o disputado Saara Ocidental.
No século VIII as regiões ocidentais formavam o Reino Bérbere da Numídia até a invasão islâmica à qual resistiram por décadas, mas acabaram derrotados e islamizados. Serão estes últimos os invasores da Espanha.
Notem os leitores a coincidência geográfica com o que está acontecendo na atualidade.
O Reino Bérbere estava isolado do sul da África, (a chamada África Sub-Saariana) pela cadeia de montanhas Atlas e pelo inclemente Saara e mantinha contatos maiores com os povos do Mediterrâneo Europeu, principalmente a Espanha. Islamizados, foi fácil cruzar o Estreito de Gibraltar e penetrar na região sul deste país, hoje Andaluzia, estabelecendo primeiro o Califado Árabe Umayyad e posteriormente os Impérios Bérbere-Islâmico dos Almorávides e dos Almohads (1040-1269). Mas os Pirineus não foram barreira intransponível e o Reino Franco Merovíngio, assim como a Aquitânia, foram invadidos pelo Emir da Espanha, Abd-er-Rhahman, que vem a morrer na Batalha de Poitiers, vencido por Charles Martel, precursor a Dinastia Carolíngia.
Detidos no ocidente, o fluxo islâmico voltou-se para o oriente. Em 751 o Turquestão é tomado da China. Outra onda de expansão parte de Bagdá e, atravessando o Golfo Pérsico, alastra-se em direção ao Irã, ao Afeganistão e ao norte da Índia. Dali, retomando forças, desloca-se para a Malásia, para a Indonésia, chegando até a ilha de Mindanao no sul das Filipinas. Em apenas quatro séculos, de 650 a 1050, considerados a Idade de Ouro do Islã, uma impressionante extensão de terra, com milhões de habitantes, convertera-se à religião do Profeta Maomé.
A Tese de Pirenne
Pirenne contesta a idéia comum de que a Idade Média se iniciou na queda do Império Romano com a derrota de Rômulo Augústulo e a tomada do poder pelo primeiro rei ostrogodo, Odoacro, em 476. Pirenne observa que os germanos que o venceram não o destruíram, pelo contrário, romanizaram-se e utilizaram-no econômica e culturalmente em benefício próprio.
Entre os germanos, o vencedor vai espontaneamente até o vencido. Entre os Árabes é o contrário: o vencido vai ao vencedor, e só pode ir se servir a Allah como ele o faz, lendo o Corão, aprendendo a língua (árabe), que é a língua santa e ao mesmo tempo língua mestra. O árabe toma o lugar do grego e do latim. Na Espanha, no século XI, mesmo os cristãos não sabem mais o latim: traduzem-se para o árabe os textos conciliares. (...) O germano se romaniza a partir do momento em que entra na România. O romano, ao contrário, se arabiza a partir do momento em que é conquistado pelo Islam. Não se permite mais qualquer influência que possa escapar ao controle de Allah. O direito do conquistador, baseado no Corão, toma o lugar do direito romano.
Entre os germanos, o vencedor vai espontaneamente até o vencido. Entre os Árabes é o contrário: o vencido vai ao vencedor, e só pode ir se servir a Allah como ele o faz, lendo o Corão, aprendendo a língua (árabe), que é a língua santa e ao mesmo tempo língua mestra. O árabe toma o lugar do grego e do latim. Na Espanha, no século XI, mesmo os cristãos não sabem mais o latim: traduzem-se para o árabe os textos conciliares. (...) O germano se romaniza a partir do momento em que entra na România. O romano, ao contrário, se arabiza a partir do momento em que é conquistado pelo Islam. Não se permite mais qualquer influência que possa escapar ao controle de Allah. O direito do conquistador, baseado no Corão, toma o lugar do direito romano.
Não se ataca a fé cristã ou judaica. Ela são solenemente ignoradas! Vem daí a idéia da 'tolerância religiosa' prevalente no Al Andaluz. Só se exige a obediência a Allah, a submissão exterior de seres inferiores, degradados, desprezíveis: os dhimmis (ver o conceito em http://www.midiasemmascara.org/artigos/religiao/11197--subsidios-para-entender-o-islam-e-as-bases-de-sua-diplomacia-ii.html). Tolerados sim, mas vivendo na abjeção. Muito se fala na 'civilização superior' dos conquistadores, mas o que trouxeram consigo foi apenas a submissão a Allah:
...só querem tomar como butim a ciência e a arte dos infiéis, que cultivarão em honra de Allah. Tomam deles até mesmo as instituições na medida em que lhes são úteis. São levados a isto, aliás, pelas próprias conquistas: para governar o Império que fundaram não podem mais se apoiar em instituições tribais. Os vencidos são súditos, os únicos a pagar impostos, estão foram da comunhão dos crentes (ummah). (...) Nenhuma fusão pode haver entre as populações conquistadas e os muçulmanos. Que contraste formidável com um Teodorico, que se coloca a serviço dos vencidos e procura assimilar-se a eles!
...só querem tomar como butim a ciência e a arte dos infiéis, que cultivarão em honra de Allah. Tomam deles até mesmo as instituições na medida em que lhes são úteis. São levados a isto, aliás, pelas próprias conquistas: para governar o Império que fundaram não podem mais se apoiar em instituições tribais. Os vencidos são súditos, os únicos a pagar impostos, estão foram da comunhão dos crentes (ummah). (...) Nenhuma fusão pode haver entre as populações conquistadas e os muçulmanos. Que contraste formidável com um Teodorico, que se coloca a serviço dos vencidos e procura assimilar-se a eles!
Os germanos conservaram o mar Mediterrâneo como o "Mare Nostrum" dos romanos, dando continuidade ao comércio e aos intercâmbios do mesmo modo que o havia feito o império. Desse modo, os povos continuaram trazendo do continente as suas mercadorias e transportando-as pelo Mediterrâneo. Os Árabes, por sua vez, fecharam o Mediterrâneo à navegação européia, convertendo a Europa, antes marítima, numa Europa continental, reduzindo enormemente a sua riqueza:
O mar, que havia sido o centro da Cristandade, torna-se a sua fronteira. A unidade mediterrânica é rompida: às suas margens estendem-se doravante duas civilizações diferentes e hostis.
Por causa destas transformações radicais, diferentemente da conquista germânica, Pirenne data da invasão muçulmana da península Ibérica (711) o verdadeiro início da Idade Média.
Convencionado como o fim clássico desta era, o ano de 1453 é marcado por uma nova expansão islâmica, maior ainda que a precedente: o Império Otomano. Naquele ano cai Constantinopla, pondo fim ao Império Bizantino. Os otomanos conquistaram a maior parte da Europa Oriental e quase todo o mundo árabe. Tiveram o seu apogeu com Suleiman, o Magnífico, cujas hostes alcançaram a Hungria e a Áustria. Como no primeiro período da expansão islâmica, os otomanos fundaram um império sobre o território europeu. O Império durou seis séculos e só acabou com a Primeira Guerra Mundial.
Há indicações claríssimas que um novo Califado, e uma nova Idade Média, se aproximam celeremente através do que é chamado de 'frêmito de liberdade e democracia'.
A nova expansão islâmica e o Califado Universal
Os movimentos 'por liberdade e democracia' que levam nossos comentaristas (sic) de política internacional a verdadeiros orgasmos estão sendo realizados por uma massa de manobras constituída de autênticos idiotas úteis, verdadeiras buchas de canhão, por organizações perfeitamente identificáveis, mas que se aproveitam da idiotia dominante nos 'fazedores de opinião' para se tornarem invisíveis aos olhos do público [[iv]]. Para os arrogantes defensores da idéia de que os ideais de liberdade e democracia são universais, e não exclusivamente judaico-cristãos, é preciso lembrar que o último Império caiu há apenas 87 anos, em 1924, e que as tradições e cultura islâmicas permanecem até os dias atuais! A arrogância é irmã gêmea da estupidez.
Há seis anos o jornalista jordaniano Fouad Hussein entrevistou Abu Musab al-Zarqawi, um dos líderes da Al Qaeda para o livro Al-Zarqawi - al-Qaeda's Second Generation na qual ele revela um plano em sete etapas para a dominação do mundo pelo Islam (vale a pena ler um resumo na TheAge.com [[v]]). Embora elaborado pela Al Qaeda, ele é facilmente endossado com mínimas discordâncias pela Fraternidade Islâmica e outros movimentos políticos, religiosos ou terroristas.
FASE 1 - O "despertar" da consciência islâmica através do ataque ao WTC para provocar os EUA a declarar guerra ao Islam e mobilizar o radicalismo. COMPLETA
FASE 2 - O de "abrir os olhos" do Islam para a "conspiração ocidental" contra a Ummah. Deveria durar até 2006. COMPLETA
FASE 3 - "Despertar e levantar" com ataques freqüentes à Turquia e outros estados árabes seculares, além do arquiinimigo Israel 2006-2010. COMPLETA
FASE 4 - 2010-2013 - Provocar a queda dos regimes árabes odiados, especialmente a Arábia Saudita, aliada e fornecedora de petróleo aos EUA. Outros estados laicos como Jordânia e Egito também seriam alvos. Terrorismo cibernético contra os EUA e o Ocidente. EM EXECUÇÃO
ATRAVÉS DOS MOVIMENTOS "PELA DEMOCRACIA" PRÓXIMAS FASES:
FASE 5 - A declaração do Califado inicialmente na área original da primeira expansão mas já com o Ocidente de joelhos (2013-2016).
FASE 6 - A partir de 2016 "Confronto total" entre fiéis e infiéis
FASE 7 - "Vitória definitiva" (até 2020 ?)
Al-Zarqawi confia em que as divisões morais, religiosas e ideológicas no Ocidente anulariam a óbvia superioridade militar ocidental que não seria páreo para os 2 bilhões e meio de muçulmanos. A Fase 4, atualmente em progressão, é necessária porque os Estados Nacionais impedem a necessária unidade da Ummah, o sentimento de grupo a que se refere Ibn Khaldun [[vi]]. Para este autor, as dinastias de grande poder e autoridade real são baseadas na religião, como no início da expansão islâmica os exércitos minoritários venciam oponentes de força muito maior (30.000 árabes venceram 120.000 Persas e 400.000 de Heráclito) por serem unidos pela força religiosa. Quando o sentimento de grupo se rompe, vários principados e emirados independentes se formam e a autoridade só pode ser mantida através de mercenários ou 'povos clientes' do Califado. Ibn Khaldun refere que assim ocorreu com o Califado Abássida de Bagdá - que dependendo dos daylam, povo do sul do Mar Cáspio, e dos turcos seljúcidas acabaram entregando o poder a eles - e com o Omíada na Espanha: quando o sentimento árabe de grupo foi destruído, pequenos príncipes tomaram o poder e dividiram o território entre eles.
É o cenário atual do mundo árabe. Além desta desvantagem a expansão do novo Califado é dificultada pelos conflitos internos entre as duas potências: a Arábia Saudita sunita e o Irã xi'ita. Mas este será o assunto da parte IV.
Notas:
[i] Recomendo o excelente artigo de Aberto Gonçalves, Jornalismo, Praça Tahrir e geografia da vítima.
[ii] O Significado dos Versículos do Alcorão Sagrado, Com Comentários, Tradução e Comentários Prof. Samir El Hayek, com a chancela do Sheik Ahmad Saleh Mahairi, Mestre em Exegese pela Universidade de Riadh, Arábia Saudita, 14º Edição, MarsaM Editora Jornalística, 2009, São Paulo, SP
[iii] Maomé e Carlos Magno: O impacto do Islã sobre a civilização européia (1937), Contraponto-Editora PUC Rio, 2010. Disponível para download (em francês) em http://classiques.uqac.ca/ classiques/pirenne_henri/ mahomet_et_charlemagne/ mahomet.html
[iv] Já denunciei isto sobre as eleições no Irã em 2009 em http://www.heitordepaola.com/ imprimir_materia.asp?id_ materia=959
[v] Quem primeiro chamou a atenção sobre isto foi Olavo de Carvalho em De onde vem a guerra: http://www.olavodecarvalho. org/semana/050915jb.htm
[vi] Al Muqqadimah - An Introduction to History, Princeton University Press
Fonte: MSM
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