O presidente Luiz Inácio Lula da Silva "desrespeita" o povo iraniano ao tratar o líder Mahmoud Ahmadinejad como um amigo e não cobrar de forma concreta mudanças na situação dos direitos humanos no país. O alerta é do advogado Mohammad Mostafaei, que defendia a iraniana Sakineh Ashtiani condenada por adultério em Teerã. Na semana passada, o advogado de 36 anos fugiu do Irã para a Turquia depois de ter sido interrogado. Ontem, Mostafaei falou ao Estado por telefone. Ele havia sido levado para um centro de detenção nas proximidades de Istambul. Ontem foi liberado e deve seguir viagem na próxima semana para a Noruega. Abaixo, os principais trechos da entrevista:
O que o sr. acha da maior aproximação entre o presidente Lula e Ahmadinejad?
(Risos). Isso é mesmo curioso. Claro que agradecemos o gesto de Lula de oferecer asilo a Sakineh. Mas o que posso dizer é que Lula tem o dever de falar de direitos humanos com Ahmadinejad. O problema não é apenas das famílias iranianas. É da humanidade. Lula trai os iranianos ao não falar das violações. É ainda um desrespeito ao povo iraniano tratar Ahmadinejad como um amigo e não cobrar mudanças na situação dos direitos humanos no país.
Mas o governo brasileiro diz que tratou do caso de Sakineh com as autoridades iranianas.
Não sei. Não posso dizer até que ponto isso foi tratado de forma séria.
O sr. conseguiu fugir do Irã. Qual será seu futuro?
Já fui autorizado a deixar o centro de refugiados e agora estou sob proteção diplomática. Tudo indica que devo ir para a Noruega. Quando sai, me senti muito aliviado. Mas quando estava a caminho do hotel, funcionários de uma missão diplomática europeia me pararam e disseram que seria muito arriscado me deixar num hotel. Agora, sob proteção diplomática, estou bem. Temo por minha família que ficou no Irã e minha mulher, que continua detida para me forçar a retornar ou me silenciar.
Como está a situação dos direitos humanos hoje no Irã?
O Irã tornou-se uma grande prisão. A situação é desesperadora e o mundo precisa saber disso. Os problemas e violações são profundos. A economia vai mal e os problemas sociais são cada vez mais evidentes. A tortura contra quem ousa falar contra o governo é imediata. Muitos estão deixando o Irã. Só na Turquia são 4 mil refugiados iranianos. Há centenas de pessoas inocentes nas prisões, sem ter quem as defenda. Essa repressão intensificou-se nos últimos meses. É um cenário desesperador.
O que o sr. sugere para mudar a situação do Irã?
Precisamos de liberdade. O governo precisa se abrir e não manter apenas relações com o Brasil e a Turquia. Precisamos construir e aceitar um novo diálogo com a Europa e outros parceiros. Internamente, precisamos dar liberdade aos jornalistas. Muitos estão presos por escrever a verdade. Sem a liberdade de expressão, nunca saberemos o que de fato ocorreu.
Teerã insiste em dizer que as sanções da ONU não estão surtindo efeito e apenas a população sofre. Qual sua avaliação?
É certo que é a população que sofre. Mas, entre aqueles que tem consciência, sabemos que sofremos por culpa do governo, e não por culpa das sanções.
O que o sr. sabe sobre o futuro de Sakineh?
Não sei muito. A Corte Suprema não aceitou reabrir o caso, o que é um sinal péssimo. Agora, só a pressão internacional pode salvá-la. Só a pressão de outros líderes poderá impedir que a executem. Por isso, apelo a todos que continuem a protestar.
Fonte: Estadão
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